Marco Regulatório da IA no Brasil

Marco Regulatório da IA no Brasil: Como as novas regras impactam empresas e criadores de conteúdo

A recente aprovação pelo Senado Federal do Projeto de Lei 2.338/2023, que estabelece um marco regulatório para o uso da inteligência artificial (IA) no Brasil, é um passo importante no caminho da regulamentação dessa tecnologia.

Embora a iniciativa traga benefícios em termos de transparência e proteção dos direitos autorais, também levanta questões essenciais sobre o equilíbrio entre regulamentação e inovação, algo que precisa ser cuidadosamente ponderado para evitar impactos negativos em um momento crucial da transformação digital.

Comparação com outras iniciativas globais

O Brasil, ao avançar com a regulamentação da IA, alinha-se a um movimento global crescente de países e blocos econômicos que buscam estabelecer regras para o uso dessa tecnologia. Exemplos significativos incluem a União Europeia, com seu Regulamento de Inteligência Artificial (AI Act), e os Estados Unidos, com a Diretiva Executiva sobre Inteligência Artificial.

Na União Europeia, o AI Act propõe um quadro legal robusto que estabelece requisitos específicos para sistemas de IA de alto risco, incluindo transparência e responsabilidade na tomada de decisões automatizadas. A União Europeia optou por uma abordagem regulatória que não proíbe a inovação, mas a coloca sob vigilância para garantir a segurança e a proteção dos direitos fundamentais. A proposta também prevê requisitos sobre a utilização de dados pessoais e como a IA pode interagir com direitos de propriedade intelectual. Embora essa regulação tenha sido amplamente elogiada por seu rigor, ela também é vista como uma possível barreira para startups e pequenas empresas de tecnologia, que podem enfrentar dificuldades devido ao custo e complexidade de se adaptar a essas normas.

Nos Estados Unidos, a abordagem é mais focada em autorregulação e diretrizes setoriais. Embora a inteligência artificial seja amplamente utilizada, as regulamentações ainda estão em desenvolvimento. O foco está em garantir que a IA seja usada de maneira ética, mas a flexibilidade do modelo americano permite que as empresas inovações não fiquem restritas a regras excessivamente rígidas. Essa abordagem tem incentivado a inovação, mas gera preocupações em relação à falta de uma estrutura legal que garanta a proteção contra abusos, como o uso indevido de dados e a falta de transparência nos algoritmos.

O Marco Regulatório Brasileiro

O Projeto de Lei 2.338/2023, recentemente aprovado pelo Senado, propõe que as grandes empresas de tecnologia informem quais conteúdos protegidos por direitos autorais foram utilizados no treinamento de seus sistemas de IA. Mais do que isso, os autores terão o direito de vetar o uso de suas obras e negociar diretamente a remuneração pelo uso de suas criações. O projeto também prevê a criação de um ambiente experimental para a negociação das compensações devidas aos autores, levando em consideração a frequência e a quantidade de uso das obras.

Esse avanço, sem dúvida, representa um benefício significativo para os criadores de conteúdo, que muitas vezes se veem à mercê de grandes corporações que se beneficiam do trabalho intelectual sem compensação justa. Além disso, a regulação pode ajudar a garantir um ambiente mais transparente e ético no uso da IA, algo que se alinha às melhores práticas internacionais, como o AI Act europeu.

Porém, o Brasil precisa estar atento para não sufocar a inovação. As exigências de transparência e a obrigatoriedade de negociar diretamente com os autores podem gerar custos adicionais e processos burocráticos que prejudicarão principalmente as empresas de menor porte. Assim como no caso europeu, onde pequenas empresas de IA enfrentam dificuldades para se adaptar ao AI Act, as startups brasileiras podem ser afetadas pela complexidade e custo de cumprimento das novas regras.

No Brasil, esse impacto pode ser ainda mais negativo, dado o estágio inicial de muitas dessas empresas, que podem ser forçadas a adotar soluções mais complexas ou até mesmo desistir de projetos inovadores.

Principais impactos

Impactos Positivos:

  • Proteção e valorização dos direitos autorais: O maior benefício do PL 2.338/2023 é garantir que os criadores de conteúdo tenham controle sobre o uso de suas obras, protegendo sua propriedade intelectual. Esse é um ponto de equilíbrio crucial entre inovação e respeito ao trabalho intelectual.
  • Transparência e ética no uso de IA: A regulação obriga que as empresas revelem quais dados estão sendo utilizados no treinamento de seus algoritmos. Isso é essencial para garantir que a IA não seja usada de forma opaca, o que pode gerar abusos como o uso não autorizado de conteúdos.
  • Incentivo à negociação justa: Com a possibilidade de negociar diretamente com os autores, cria-se um ambiente mais justo, permitindo que as empresas paguem de acordo com o valor e o impacto das obras utilizadas, sem explorar de maneira desproporcional o trabalho dos criadores.

Impactos Negativos:

  • Aumento da burocracia e custos operacionais: A exigência de negociação de remuneração e a necessidade de transparência sobre o uso de conteúdos podem gerar um aumento considerável nos custos e na burocracia para empresas, especialmente as menores. Esse processo pode reduzir a competitividade e inibir a inovação, criando um mercado mais fechado.
  • Desigualdade competitiva: As grandes empresas de tecnologia, com mais recursos, terão mais facilidade para lidar com a regulação. Já as startups e empresas de menor porte podem enfrentar barreiras significativas. Isso pode criar um ambiente de negócios desigual, favorecendo grandes players e prejudicando a diversidade e inovação do mercado.
  • Possíveis ambiguidades na aplicação das regras: Como em qualquer nova regulação, a aplicação das normas pode ser complexa e suscetível a interpretações variadas. A linha entre uso comercial e não comercial, por exemplo, pode gerar disputas e incertezas para as empresas.

Como tudo na vida, precisamos de equilíbrio

O desejo de regulamentar e proteger os direitos autorais não pode impedir o desenvolvimento tecnológico e inovações essenciais para o crescimento do ecossistema digital.

O mundo da IA está em constante evolução, e as empresas brasileiras precisam de um ambiente regulatório que as permita experimentar e inovar sem o peso de regulamentações excessivamente restritivas. No entanto, a inovação não pode ocorrer à custa da exploração injusta de criadores e profissionais. O Brasil tem a oportunidade de estabelecer um marco regulatório que equilibre essas duas forças — proteção dos direitos dos criadores e liberdade para a inovação.

O projeto aprovado no Senado é um passo importante nesse sentido, mas será necessário um acompanhamento rigoroso na Câmara dos Deputados para garantir que o resultado final não prejudique a competitividade das empresas de tecnologia ou limite o potencial da IA como força transformadora da economia digital.

Para saber mais, acesse: https://www.gov.br/cultura/pt-br/assuntos/noticias/senado-federal-aprova-marco-regulatorio-da-inteligencia-artificial

Rodrigo Neves
Presidente Nacional da AnaMid
CEO da VitaminaWeb

Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não necessariamente corresponde à opinião da AnaMid.

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